Abaixo a “atitude de velho”

Os números no nosso documento podem ser bem concretos, mas a velhice é mais que nada psicológica. Aqui em Buenos Aires eu fico realmente admirada com a quantidade de velhinhos que encontro qualquer dia que saio na rua. Gosto de ver que eles não se inibem pelos seus passinhos lentos, nem pela ajuda da bengala ou do andador, se preciso, e circulam por toda a cidade e mantêm uma vida social muitíssimo mais ativa do que eu costumava ver no interior e na capital de São Paulo. No Brasil minha sensação é de que as pessoas tendem a se esconder na velhice. Se enfurnam em casa, evitam lugares públicos e atividades que “já não são pra essa idade”. Como se se reunir com gente querida, passear ao ar livre, tomar um café sozinho ou acompanhado fosse restrito aos maiores de 21 anos e menores de 60. E justamente quando se tem mais tempo disponível e mais histórias pra contar!

Em Buenos Aires, ao contrário, as calçadas, os ônibus, as academias, as lojas e, claro, os cafés, são frequentados por “jovens senhoras” sempre elegantes, maquiadas, com roupa combinada, acessórios e penteados. E também pelos “jovens senhores”, verdadeiras reproduções de Gardel, geralmente com roupa social, lenço no pescoço ou cachecol. Parece que as rugas não impedem que eles continuem cuidando da própria imagem, mantendo a pose e fazendo as coisas de que gostam e que tem vontade de fazer, quando a saúde não atrapalha. No Brasil isso é raro, apesar do estímulo de familiares que querem vê-los mais animados e ativos e dos incentivos financeiros para eles saírem de casa – com transporte público de graça, ingressos mais baratos, vagas de estacionamento e filas preferenciais. Coisas que defitivamente não existem na Argentina!!

"Não interessa quanta saudade eu possa chegar a sentir da minha juventude, eu não desistiria do que eu tenho hoje pra voltar àqueles tempos." - Hugh MacLeod

Tudo isso é bastante contraditório nos dois casos. Um país tem a atitude natural, mas não as regras de convivência que beneficiem essa cultura. No outro temos as regras, mas nem assim conseguimos criar essa cultura. Será pela insegurança das ruas no Brasil, que coibe qualquer um de sair de casa? Ou será o orgulho pessoal que eles nutrem aqui? Diversas vezes eu escutei de senhores meio ofendidos que não queriam e nem precisavam do meu assento, de onde eu já tinha saído pra eles não precisarem ficar “surfando” no ônibus, trem ou metrô. Teve um até que me deu um sermão sobre os seus áureos tempos de remador profissional e o seu atual treinamento para participar de corridas. Por isso, acho que é mais fácil ver gente se levantando no ônibus e no metrô para dar lugar a crianças ou adultos com bebês do que ver alguém oferecendo o lugar para idosos. Os próprios idosos inibem as pessoas de ajudá-los. Mas não deveria inibir o governo e as instituições de implementar algumas regras, como assentos reservados e filas preferenciais – que são exclusividade de grávidas, adultos com bebês e pessoas com necessidades especiais.

Acho que, assim como um passeio por Buenos Aires à tarde – perto da hora do famoso “chá das 6h” – pode ser um grande exemplo pros brasileiros quererem postergar a “atitude de velho”, também seria interessante os argentinos conhecerem iniciativas que no Brasil existem para facilitar a vida das pessoas mais velhas. Afinal nós e eles sempre podemos aprender um pouco do outro!

6 thoughts on “Abaixo a “atitude de velho”

  1. Mariana Della Barba 13/06/2011 / 19:34

    Que lindo post, Re!
    Ah, se brasileiros e argentinos discutissem menos de futebol e passassem mais tempo trocando boas ideias 😉
    bjos

  2. gisavame@hotmail.com 14/06/2011 / 15:42

    Sempre admirei a elegância e disposição dos idosos de Buenos Aires. E também sua participação na vida social. Quando ficar velha (pela idade faltam poucos meses; pela cabeça não sei) quero ser assim.

  3. Gildete Valério 14/06/2011 / 17:45

    Interessante essa sua maneira de ver a velhice. do jeito como você expôs o assunto, eu me sinto mais argentina do que brasileira nessa atitude de “velha” (depois dos 60). Isso porque os brasileiros jovens acham que velho não deve fazer isso ou aquilo… preconceito dos jovens, dos adultos e… dos próprios idosos… Acho ótimo viajar, passear, andar pelas lojas, ir ao cinema sozinha ou acompanhada, enfim, continuar a fazer as coisas que eu sempre fiz e gosto de fazer enquanto a saúde me permitir.
    Por isso, digo sempre, “QUANDO EU FICAR VELHA…” he he he…

    • renatavmesquita 14/06/2011 / 18:42

      E que continue pensando assim sempre!
      Afinal, a velhice é psicológica! E a “atitude de velho” mais ainda!

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