Direto e reto

A capacidade do argentino de ser preciso é proporcionalmente igual à sua habilidade para ser genérico e não dizer nada.

O maior exemplo de precisão para mim é a palavra “escarbadiente”, em tradução livre “escavador de dente”, que como não podia deixar de ser é o nosso “palito de dente”. É a explicação exata, nua, crua e meio nojenta do papel que tem esse pedacinho de madeira usado para limpar o sorriso. E “sorbete” é o canudo, afinal você sorve (chupa o líquido) por meio dele. Mais direto ao ponto não podia ser, né?

Só que o argentino também dá o seu “jeitinho” quando quer ser bem amplo e dizer tudo e nada ao mesmo tempo. “Al mediodía” não é o que o brasileiro imagina, ou seja, o nosso meio-dia, 12 horas em punto. Ao contrário, é qualquer hora entre às 11 da manhã e às 15 da tarde.

Mas se todo esse intervalo de horas não for suficiente para você fazer o que devia, é só tirar a sua melhor desculpa da manga: “Tuve un inconveniente” (Tive um inconveniente). Esse é o argumento pra qualquer coisa que não se quer explicar. E o mais interessante é que a conversa termina aí. Um brasileiro nunca anuncia um “tive um problema” e termina aí. Isso costuma ser só uma introdução que dá tempo para o outro sentar e se acomodar porque uma longa história vem  em seguida. Mas aqui, perguntar o que aconteceu depois dessa sentença fatal é superdeselegante e está restrito a chefões, pais e autoridades, como maridos e esposas, pra quem é preciso “sí o sí” (sim ou sim, ou seja, não há opção) apresentar um álibi bem forte.

Outra boa é “tuve que hacer un trámite” (tive que fazer um “trâmite”), que não se trata de nenhuma questão burocrática, como seria em português. Só se passar na padaria para comprar pão ou buscar o carro no estacionamento ou comprar o que for que esteja faltando pra sua receita puder ser interpretado assim.

Mais uma saída discreta para não ter que ficar se explicando: “te conviene” ou “no me conviene”. Direto, reto, sucinto e economiza um monte de rodeios e, até algumas “mentiras brancas” pras quais a gente às vezes apela. Principalmente porque, como eu já comentei, quando eles são precisos eles são precisos de verdade. Mas sem dúvida muita história boa e conversas legais se perdem, às vezes falta um pouco mais de interação. Eita secura estéril…

3 thoughts on “Direto e reto

  1. Mari 30/05/2010 / 04:56

    Hahahaha. Concordo em genero, número e grau, Re, Estou com voce e nao abro. Mas a gente vai vivendo e aprendendo, né?
    Beijos,
    Mari

    • renatavmesquita 31/05/2010 / 03:18

      E vai usando essas “armas” deles a nosso favor também, né? hehe…
      Besote e volte sempre!

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